quarta-feira, 8 de outubro de 2008

O tempo e outras coisas

Era uma vez um vilarejo, fundado por açorianos, famílias que chegaram em barcos, pais, filhos, tias e avós, trazendo na bagagem a vontade de criar raízes, construir lares, ter vizinhos, amigos, comadres, compadres, cultuar suas origens e ser feliz, com quem mais estivesse por ali.
O tempo foi passando, o lugarejo virou distrito, cidade e capital do Estado. Aqueles açorianos foram recebendo visitantes, forasteiros, gente que vinha de longe, gostava do que via, se apaixonava pelo lugar e resolvia ficar, sentar posada, trabalhar, criar seus filhos ali e, também, ser feliz.
Décadas e séculos mais adiante, aqueles açorianos originais, quase nativos, já não se sentiam mais tão à vontade, tão donos de seus rincões, porque tiveram que dividir espaços, conviver com culturas diversas as suas e aprender a dividir aquela beleza natural com os “estrangeiros” que – agora que moravam ali há muito tempo, passaram à condição de “da terra” também, por mais que falassem com outro sotaque e fossem facilmente reconhecidos como “de fora”.
Com o progresso e o passar dos anos, as gerações seguintes evoluíram, deixando de lado as ranhetices de seus antepassados. Superaram os preconceitos e curaram inúmeras fobias. Aquele povo açoriano, hoje, convive pacifica e harmoniosamente com estes “de fora”, absolutamente integrados, sem ranços, sem complexos de inferioridade que um dia tiveram, mas que o tempo, a educação e a fraternidade universal os fizeram maiores e, em fim, todos iguais.
Hoje, ninguém é mais “de fora” ou “daqui”. De que cidade estou falando? Alguém pensou que fosse Florianópolis? Não, esta é uma resumida história de Porto Alegre, que já se chamou Porto dos Casais, casais açorianos. Estas referências são encontradas hoje no Bairro Cidade Baixa, na capital gaúcha, preservadas, numa Praça chamada “dos Açorianos”. Conto isso porque há 24 anos vejo, constrangido, pessoas serem apontadas como “de fora”. Mas me conforto sempre quando lembro desta história.
Agora pouco li no Blog do meu irmão Carlos Damião uma destas tantas referências tão tristes, por conta das eleições e dos eleitores que votam aqui. É uma questão de tempo e de outras coisas e sei que um dia meus filhos, meus netos e bisnetos se confundirão na Praça XV e nos Sambaqui’s, eternamente, com este povo açoriano e maravilhoso de Florianópolis.

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